Acontece que um jornal, daqueles do tipo sério, um dos tais que costumam inventar notícia sempre que o caixa vai a zero (e dizem que o caixa sempre está sempre no zero), decidiu publicar que Dom Pepe, gerente fofucho do Circo Mequetrefe deu na louca de fugir com a bilheteria do espetáculo do último final de semana e, graças aos recursos do photoshop, ilustrou a matéria com fotografias do queridinho das balzaquianas frenéticas (exímias frequentadoras dos bailes da melhor idade e saudosistas contumazes dos festivais de MPB nos anos 60), que adoram cultivar canteiros de antúrios numa chácara na periferia de uma grande cidade, lá pras bandas da caixa-prego, pertinho donde o vento faz a curva, feliz da vida tal qual pinto ciscando em terra molhada…
Escândalo como este não se criava a anos. Todos os operadores do direito, notadamente aqueles na bica de serem nomeados, sem embargos de qualquer natureza, para gozarem de sinecuras nos tribunais superiores, mostraram suas indignações em comentários nas páginas dos leitores dos periódicos de maior prestígio nas altas esferas, além de textões repletos das mais supimpas citações jurídicas do tempo do onça nas redes sociais.
Temi um tsunami, mas a marola foi logo contida com a intervenção providencial da turma que continua p*ta da vida com rumo da política e, principalmente, o preço das coisas e não encontra alternativa senão apelar para pelancas e pés de galinha que, diga-se de passagem, andam custando os olhos da cara.
As avós e mães solteiras (que carregam nas costas uma penca de buchudinhos catarrentos a título de investimento no futuro do país), foram às ruas gritar sua indignação diante da desfaçatez das patroas que somem com aquele anel de diamante e, perante a companhia de seguro acusam a doméstica de roubo de propriedade e vão à justiça solicitar o encarceramento da serviçal enquanto aumentam o valor das apólices sobre o preço futuro dos alimentos criando uma espiral de inflação que destrói a economia, precariza o trabalho e, ainda por cima, mantém a sustentabilidade de uma política econômica austera ditada pelo capital internacional que precisa investir os tubos na colonização de Marte – única saída para o aquecimento global.
Houve uma reação da ala que torce pela terceira guerra mundial, a turma que não tem dúvida de que o Cristo só retornará para levar os seus 144 mil para sentarem à direita do Todo Poderoso após a queda do sistema que usa vacina para implantar chip nas pessoas; que rotula os indivíduos com a marca da besta através do código de barras; que produz discos para serem escutados ao contrário; e aposta todos os dízimos de que o Estado de Israel é a ponta de lança deste processo de fim e recomeço do povo de Deus. Tais pregações, mesmo extrapolando as paredes do armazém de número 100 na Rua dos Aflitos (que, por sinal, deve o aluguel a mais de seis meses e, portanto, já recebeu ordem de despejo expedida pela Vara das Execuções da Capital), não conseguiu qualquer comunicação com a civilização alfacenturiana através do celular o que só fez aumentar as imprecações contra deus e todo mundo, e a adoção desesperada de um pneu a quem pudessem dirigir suas preces tal qual os fugitivos do Egito inconformados com a falta de pulso e tino do guia Moisés.
Eu, que estava desassossegado diante de tanta desinformação decidi fazer de conta que nada disso me dizia respeito e fui molhar os pés nas areias do Abaeté, na esperança de que Iemanjá desse o ar da graça e lançasse, em minha direção, os desejosos ohos da daquela morena de cabelo acastanhado que saracoteia diante do meu tesão já faz uma cara.