Allegory of the five senses, Theodoor Rombouts, 1632
o
perfume que vem da casa ao lado
o
alarido juvenil a afastar demônios
os
latidos dos cães na madrugada
o
ruido das ondas a descansar na praia
o
gotejar da chuva na telha de flandres
a
ventania que assusta os coqueiros
e
a lembrança daquele amor que partiu
a
sala úmida cheira a passado
e
o frango com verduras que fiz ontem
me
faz pensar em dormir e sonhar
até
que a tarde vista o manto noturno
e
acalente no colo o bebê chorão
que
deseja crescer e ir pra rua aprender
a
alegria quente e fria do são joão
os
olhares ameaçadores dos homens, eis!
e
a indiferença de suas mulheres,
maquiadas
adolescentes esquecidas
de
suas velhas mães banguelas
que
puxam conversa no coletivo
e
despertam o fingimento covarde
das
pretensões burguesas televisionadas
nas
ignorâncias demasiadas
meu
próximo é um
concorrente
devo
simular
que
posso (quero
crer)
e
apertar
a campainha, descer
no
ponto
que,
neste começo
de noite,
me cabe…
quem
sabe sinta
o perfume que
a
vizinha exala
e
ouça
a
criançada
a
botar
pra
correr os demônios