Naquela noite, o velho senhor deitou-se mais cedo. Logo acercou-se uma voz íntima que chorava.
O velho quis interrogá-la, saber sua história mas, a voz não dizia, não falava… Só chorava. “O que esconde este choro”, pensou.
E antes que entrasse no sono, sem que arredasse o corpo de cima da própria cama, andou e andou, atravessou oceanos, escalou montanhas, desceu através de vales e só então percebeu que era de seus lábios que nascia a voz que chorava. Fora, o vento ensaiava seu uivo – mas era o choro interior que o preocupava.
…
Decidido a dormir, o velho senhor, naquela noite conseguiu alcançar sono profundo, mas sem sonho ouviu a voz, ouviu o choro que vinha de si mesmo.
Rajadas de vento açoitavam a janela nervosa, obrigando-o a abrir os olhos e, sem mover um músculo, viu uma criança – pequena, frágil, envolta em lágrimas e luz – emergir da escuridão tempestuosa. Suas mãos calejadas, com candura, a apanharam tal qual a um pássaro ferido. Aconchegados um ao outro, gemeram e perceberam a dor de existir. A dor é o próprio existir. Porém seus olhos de criança não mais choravam mas despertaram no quarto um singelo acalanto acompanhado pelo vento que zunia.
…
E o velho habitou a voz
E a voz habitava o mundo
E o velho era o mundo
E o mundo era dor
E o mundo era velho
E o velho viu
Que além da dor
do medo
da noite
da janela que estremecia
Entre o gemido e o vento
Havia-lhe nascido
Um poema de silêncio e asas
O velho enfim sorriu
e dormiu tal qual
quem nunca chorara antes.
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