lá vem a guerra
pontual
bater outra vez
a minha porta
lá vem a guerra
com a bandeira da paz
(paz é que nem jesus:
palavras apenas
usadas em vão)
lá vem a guerra
assídua
mais uma vez bater a minha porta
exigir minha adesão
e ousa a molambenta, esculhambada
desdentada, muxibenta
irmã da fome e da miséria
falar em nome da liberdade
do dever, da responsabilidade
porque não há nada mais cívico
e patriótico que a guerra!
lá vem a guerra
rotineira e infalível…
ai de mim se digo não
à sua lengalenga
viro traidor
da pátria, dos bons costumes,
da família e da propriedade…
lá vem a guerra
indispensável
perder tudo que é nosso
em nome de uns tais princípios
que não vale para os outros…
– ah, sim os outros
são sempre os outros
o lado de lá
o inimigo… range os dentes
a estridente guerra
ao mencionar
aqueles que não devemos mencionar
e fala horrores
e simula chiliques
desenterra recalques
atiça temores
e aviva rancores…
agirá assim
quando amanhã,
essa ferramenta darwiniana
a serviço do progresso dos povos
livres, leves e soltos das democracias exemplares,
for a vez de bater a porta dos outros?
lá vem a guerra
mais uma vez
impecável
indubitável
irremediável… e última.
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