The Piano, Pablo Picasso, 1957
morreu
ontem
um
homem
recostado
ao seu piano…
não
o conhecia
(embora
seu nome não fosse de todo estranho)
um
jornalista escreveu uma
singela nota
sete
linhas
sobre
o amigo
… e
nada mais se falou
também
falar o quê
diante
daquela imagem singular
a
lhe
imortalizar
o
derradeiro
instante?
… há
os que sucumbem
infartados
na calçada
os
que partem
velhinhos
em
casa ou no hospital
aqueles
que falecem
jovens
nas
periferias
tantos
acidentados, afogados, eletrocutados
queimados,
envenenados
assassinados…
mas
recostado a um piano…
que
tipo de gente
morre recostada
a um piano?
ainda
mais não sendo músico
nem
poeta
que
tipo de humano
morre assim tão diferente
não
sendo artista?
não,
não era comum este homem
não
é comum morrer assim uma morte demasiado poética
e
nem era cineasta, ele
a
enquadrar o momento
última
cena
pose
congelada
morreu
ontem
um
homem humano
estava
de barba, boné
cercado
de livros
discos,
vinhos, lembranças
sentidos
e significados…
era
um filósofo
que
ia à padaria e vivia numa esquina
por isso era de fato diferente
bem
diferente dos desumanos
daqueles
que
não
ousamos
dizer que têm
virtude
afinal,
apenas
de humanos
podemos
apontar defeitos
e
o homem que morreu ontem
encostado
ao piano
cometeu
a
mais
terrível
das
faltas
soube
ser gente
pessoa
por
isso lhe foi permitido partir
enquanto
os dedos brincavam sobre um
teclado
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