Nina Akin, Alemanha
Três
lugares que não gosto de entrar: delegacia, hospital e repartição
pública. Devo ter entrado umas duas vezes numa delegacia por motivos
que fugiam totalmente ao meu controle. E justamente por motivos que
escapam ao nosso controle é que entramos num hospital. Já numa
repartição pública, em geral, costumamos perder o controle.
Certa
feita levei Mainha a um pronto socorro:
Insuficiência
respiratória e cansaço extremo a torturavam. Descobriram tratar-se
de coisa grave, com consequências nada promissoras para os sistemas
pulmonar, renal e cardíaco.
Decidiu-se
pela internação imediata e lá fui eu, compulsoriamente, alojar-me
numa poltrona ao lado do leito, por duas semanas, dormindo não mais
de quatro horas por noite - com sorte.
Entre
uma voltinha e outra para arejar a cabeça, senti falta de algo. Algo
que não vejo há tempo. Bem, não faz tanto tempo assim, se levarmos
em conta o nosso curto tempo da vida.
Falo
de um item obrigatório em toda e qualquer parede de hospital: uma
foto (ou seria gravura?) de uma enfermeira com o dedo indicador sobre
os lábios a nos solicitar silêncio, a nos informar tratar-se ali de
um local de circunspecção.
É
certo que hospitais surgiram do esforço de comunidades religiosas e
foram durante muito tempo administrados por religiosos. Daí surgir,
certamente, aquela reverência diante da dor e da morte exigida pela
moça de branco.
Porém,
com a mercantilização da medicina, a piedade e a misericórdia saíram de fininho pela porta de trás. E na mercantilização da
vida, administrada por uma burocracia insensível e desumana, a
reverência cedeu lugar a informalidade do banal.
Dessacralizar
o exercício da medicina, levar o paciente a sentir-se em casa, talvez ajude na recuperação... Porém, constato que o tom de voz nas
dependências de um hospital, ultimamente, está alguns
decibéis acima daquilo que a simpática enfermeira indicava.
Não
raro, vemos em salas de visitas televisores sintonizados, em
programas policiais, novelas ou ante sala dalguma celebridade, enquanto
pacientes, enfermeiros, auxiliares, pessoal da limpeza, vigilantes,
administrativos, residentes, etc., etc., trocam impressões como se
estivessem num botequim ou no portão de suas casas. Nos
supermercados somos mais reverentes.
Dirão
que exagero… E que cada povo busca afirmar-se em seus próprios
valores, atitudes e ideais. E justamente por sermos o país do
carnaval e do futebol, somos assim tão expansivos, inquietos e
exuberantes… Concordo plenamente. Mas por quanto tempo ainda
preferimos tagarelar feito maritacas? E aí, olho pra mim e vejo o quanto sou
impulsivo, o quanto me assusta o que não sei, o quanto me apavora e
exaspera aquilo que não é igual.
De
qualquer modo, o atendimento excedeu as minhas expectativas em se
tratando de um hospital público. Sinto-me agradecido e dou vivas as
nossas melhores qualidades e aos profissionais que as exercitam sem deixar de mencionar aquela pequena autoridade que
nos recebe na entrada com um angustiante “na onde o senhor vai?”
Em
momentos tais, costumo ficar dividido: Somos um caso de polícia, uma
questão de saúde pública ou apenas um erro de português?
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