sábado, 14 de abril de 2018

Terça Fake


Fire! Fire!, Enrico Baj, 1964



tiro os ruídos
os apelos da televisão
(ligada eternamente em berço esplendido
ou em cenas cotidianas de filmes Z)
dou um tempo nos compromissos
(mesmo os inadiáveis, os familiares
aqueles que causam infarto)
e abstraio… deixo pra lá
esqueço
o sujeito ao lado
tipo esquisito
ao qual não pretendo
nunca mais
dirigir palavras

embora
seja óbvio que a culpa foi minha
não sei o que me passava pela cabeça
quando resolvi fazer aquele comentário
e o pior:
estranhar
quando ele falou o que pensa

pois é, tudo isso
em meio a essa terça
ardida
mentirosa
fingida
refutadora do outono
terça fake… que arde e arde
mais que esse inferno
eletromagneticamente carregado
em que nos metemos…

só falta os jagunços
        (de terno, farda ou toga
        aboletados em privilégios)
surgirem na porta do bar
e nos informarem que passamos do ponto,
que já nos queimamos demais
expostos a tantas afirmações
(abrasadoras proposições)
que melhor mesmo é caluda
antes
antes que a casa caia
(e essa poeira espessa
tóxica
tome por completo as ruas
deus sabe por quantas luas e sóis
- se é que ainda existe lua
ou sol
que mereça ser visto ou lembrado)

num completo dejá-vu
prosseguirão a parada
exibindo, através de seus uniformes,
aquele certo ar confiável,
do tipo de quem
jamais ameaça gratuitamente

o negócio é vir à tona
- do fundo da minha abstração - 
         (ou seria estupor?)
e deixar-me arrastar por essa terça
cacofônica
e encarar
a ineficácia inventada do meu gesto…

deveras:
não fazemos mais amigos como antigamente


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