sábado, 17 de fevereiro de 2018

um conto dialógico


Indoor dialogue, Wojciech Siudmak, 1998


- abre a porta
- me deixa
- estou preocupado
- com o quê
- com a tua saúde
- me esquece
- me deixa entrar
- não, não há mais nada entre nós
- dá mais uma chance
- sem volta
- verdade
- nunca menti pra você
- e eu nunca dissimulei
- é você é verdadeiro eu que não percebi
- a vida só tem graça quando estamos juntos
- não posso impedir tuas fantasias
- não quero ficar sozinho
- é tão dificil
- o quê
- isso
- o que nos impede
- teu desatino meu medo
- você é muito mais forte que eu
- quero ficar sozinha
- podemos ser amigos?
- melhor não
- então é isso adeus
- adeus
- quando te conheci durante aquela caminhada já havia desistido mas o teu olhar me mostrou que ainda havia possibilidade foi isso que me fez voltar no dia seguinte e te procurar pelo caminho quando te encontrei sentada debaixo daquela figueira foi como se o universo nascesse em mim
- chega te imploro não me tortures mais


- aquele ali o que fez?
- muita manguaça… pintou e bordou...
- dê uns tabefes e bota na rua… o magrelo?
- ladrão mixuruca
- trabalha pra quem?
- independente
- bota na limpeza… e esse, agarrado às grades?
- agrediu a mulher
- ela enfeitou tua cabeça, foi?… é mudo, é?
- está catatônico desde que chegou… deve ter tomado droga pesada
- a mulher deu queixa?
- deu
- não tô afim de preencher papelada… bota na cela com o “mãe de todos”…
- “mãe de todos” já passou da hora pra ser solto...
- alguém intercedeu por ele?
- até agora não...
- taí… deixa o psicopata brincar
- o senhor é o delegado
- qualquer coisa me chama no celular...


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