sábado, 30 de maio de 2015

Duas Palavras

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Quando uma palavra decide chamar atenção é que nem serviço pela metade: exerce pressão.

Recentemente duas pegaram no meu pé: vintage e cunilíngua. Nunca as li ou ouvi mais gordas. A primeira tem me perseguido em textos sobre arte e tendências e a segunda, ouvi num episódio de série cômica com Larry David e agora a danada me aparece figurando no conto Pudico do Rubem Fonseca.

A bem da verdade, é bom que se diga, tenho passado muito bem sem elas. O problema é que quando conheço uma palavra nova sofro um tempo até perceber que é realmente nova pra mim e depois, outro tanto, para descobrir o que a tal tem a dizer.

Enquanto isso, atazanam meu sossego. As atrevidas aparecem sem serem convidadas. À sorrelfa. E pior, alojam-se no lóbulo da orelha e ficam lá, penduradas, miando como se fossem gatos em teto de zinco quente, doidos pra levar uma chinelada.

No começo, tento ignorar. Finjo que não é comigo. Mas existe um perigo: ficar sabendo algo que não sabia, faz da gente cúmplice de alguma coisa. E eu não gosto de ser envolvido em confusão. Principalmente com palavras. Palavras podem ter o peso de montanhas ou a leveza de uma pluma. Depende apenas das circunstâncias em que foram geradas e lançadas ao mundo.

Com o tempo, mais calmo, passo a observar-lhe o contexto para ver se consigo intuir algum significado. Derradeiro, quando já não aguento mais a aporrinhação, abro o dicionário e confiro o que ela quer que eu saiba.

É aí que o bicho pega. Porque em geral, me frustro. Enquanto a gente não sabe, elas dão a impressão de serem coisa de muita importância, carregarem significados do outro mundo, mistérios ocultos, revelações bombásticas.

Talvez por isso, demore tanto a desnudá-las. No fundo, no fundo gosto dessas preliminares, de ser perseguido pela incerteza.

E isso me faz lembrar de outro gato, nesse caso o do Schrödinger. O tal que está preso numa caixa. Enquanto não é aberta não dá para saber se o felino está vivo ou morto. Depois que a gente abre, das duas uma: ou o gato está mortinho da silva ou ele pula com unhas e dentes na nossa cara, puto da vida por ter sido mantido em cativeiro apenas para que um físico demonstrasse sua teoria.

Dessa forma, para nós humanos o resultado de uma hipótese é sempre uma incógnita. Até o momento que a gente vai lá e confere se o “gato está vivo ou morto”.

Mas o que isso tudo tem a ver com aquelas duas palavras, vocês devem estar se coçando de curiosidade. Bem, a primeira quer nos dá a dimensão do que seja antigo. Diz que tudo que tem entre vinte e cem anos, é vintage. Após os cem é antiguidade.

Quanto a segunda, trata-se da boa e velha prática de estimular os órgãos sexuais femininos com a boca ou com a língua.

O que me leva a pensar que a gente precisa prestar mais atenção às palavras. Afinal, andam a surgir algumas que nada dizem, nada acrescentam e outras que, infelizmente, desapareceram por absoluta falta de uso.


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