sábado, 10 de janeiro de 2015

Um adjetivo pra chamar de meu


Hacke, Arnulf Rainer, 1971


Talvez seja o calor ou a ociosidade
Mas ando feio, sujo e farto
E nem por isso mais triste ou desesperado
Embora em dias tão bicudos nada seja demasiado

O fato de me sentir assim não acrescenta
Tampouco diminue qualquer coisa
Àquilo que já estou acostumado
(Não é novidade pra ninguém
Que está dificil encontrar o tom da coisa)

Nem tentem, não estou louco
Garanto – se isto é possível – que não sou louco
Talvez um tanto desnorteado e isso é só
Minha imperfeita imaginação – o que não é tão grave, afinal
Trago a minha vontade debaixo de rédeas curtas
Pois todo cuidado é pouco inda mais com as palavras

Pensei: é só um jeito, familiar de ver o mundo
Talvez o espírito do tempo, isto de deformar tudo
Nós, os cansados, ávidos de prazeres sem virtudes

Mas eis que o não atravessado na garganta
E a ânsia de síntese correm o risco, contraditório,
De ao tentar curarem o doente, o arruíne, suprima o que importa

As musas, as lindas musas
Limpas, cheirosas, sorridentes, completas e negadoras
Permanecem inacescíveis, utópicas, à parte,
Dos nossos inventivos e multifacetados jardins...

Por favor, não quero mais sofrer horas assim
Repletas de ruínas, bizarrices, estupidez e furos de balas
E o pior de tudo é o adjetivo oculto que não completa a frase
Diga-me, sem presunção e sem recorrer à metafísica
- O que torna a jornada (?) é o nosso destino certo.


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