Hacke, Arnulf Rainer, 1971
Talvez seja o calor ou a
ociosidade
Mas ando feio, sujo e
farto
E nem por isso mais
triste ou desesperado
Embora em dias tão
bicudos nada seja demasiado
O fato de me sentir assim
não acrescenta
Tampouco diminue qualquer
coisa
Àquilo que já estou
acostumado
(Não é novidade pra
ninguém
Que está dificil
encontrar o tom da coisa)
Nem tentem, não estou
louco
Garanto – se isto é
possível – que não sou louco
Talvez um tanto
desnorteado e isso é só
Minha imperfeita
imaginação – o que não é tão grave, afinal
Trago a minha vontade
debaixo de rédeas curtas
Pois todo cuidado é
pouco inda mais com as palavras
Pensei: é só um jeito,
familiar de ver o mundo
Talvez o espírito do
tempo, isto de deformar tudo
Nós, os cansados, ávidos
de prazeres sem virtudes
Mas eis que o não
atravessado na garganta
E a ânsia de síntese
correm o risco, contraditório,
De ao tentar curarem o
doente, o arruíne, suprima o que importa
As musas, as lindas musas
Limpas, cheirosas,
sorridentes, completas e negadoras
Permanecem inacescíveis,
utópicas, à parte,
Dos nossos inventivos e
multifacetados jardins...
Por favor, não quero
mais sofrer horas assim
Repletas de ruínas,
bizarrices, estupidez e furos de balas
E o pior de tudo é o
adjetivo oculto que não completa a frase
Diga-me, sem presunção
e sem recorrer à metafísica
- O que torna a jornada
(?) é o nosso destino certo.
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