Garrincha encara um russo
Suécia, 15 junho de 1958
Embora continue um bom perna de pau, o futebol sempre fez questão de ficar perto de
mim.
Nunca participei de
nenhuma equipe nem no meu tempo de escola.
Mas sempre nutri
simpatia pelo esporte das multidões.
Por conta do sargento
Pedro Nunes.
Que me deu uma
carteira de identidade militar.
E com isto abriu pra
mim os portões do estádio Lomanto Júnior.
Foi seu jeito de me
proibir de faltar ao jogo nas tardes de domingo.
Foi seu modo de me
manter por perto.
Talvez por que
quisesse fazer de mim um “crente”.
Acho que ele tinha
medo que eu bandidasse.
O sargento era um
torcedor fanático do Botafogo carioca.
A base do Esquadrão Imortal.
Com o sargento assisti
aos jogos da Copa de 1958.
Nós dois ligados no
sistema de alto-falantes.
Sentados num banco de
praça.
Praça XV de Novembro,
diante da Confeitaria Gato Preto.
Vitória da Conquista,
Bahia.
E foi aí que
compreendi o porquê da gente gostar do esporte.
É meio culto,
celebração, comunhão de gentes…
Uma grande transada
coletiva onde o gol é o orgasmo geral.
Charles Chaplin, em O
Grande Ditador, batendo aquele bolão com o globo terrestre,
silenciosamente nos mostrou qual é a do jogo:
Paixão, afeto,
engenho e arte.
Tudo o mais é
conversa mole, que pra mim foi enterrada com a Seleção do Tri.
Quando vejo ausência
daquelas quatro faculdades, nos jogos por aí, garro a
imaginar a alegria que senti naquela tarde de junho, ali em meio
aquela algazarra, quando o sargento Pedro Nunes sorriu para mim pela
primeira vez.
A paixão faz a gente
melhor… Com certeza.
O problema é que, o
que é bom não é para sempre.
O sargento morreu mas,
seu gesto ficou.
E muitos anos depois,
como se o destino tivesse marcado, como se tudo tivesse consequência,
encontro, num boteco, na mesma avenida em que acenei para os
bicampeões do mundo, o Mané – O Garrincha.
Abracei o Anjo Torto
como se abraçasse o sargento que nunca abracei.
E sorri, sorri muito.
E agora estou aqui a
pensar no drible, da jogada do entorta, do passe na medida, do gol
genial, de bico, de tabela, de trivela…
Penso no instante em
que a gente alcança o infinito.
Penso no momento que a
gente toca a bendita felicidade.
E hoje ao desejar boa
campanha Brasil, rogo:
Por favor, canarinhos,
não joguem pra mim, que sou este eterno perna de pau.
Não joguem pela
montanha de dinheiro que ganham e certamente vão ganhar.
Joguem, praqueles
meninos e meninas, praquela garotada que está na infância e sonha
em sentir a mesma alegria que senti naquele dia de junho, na praça
XV de Novembro, ao lado do cara que aceitou ser meu pai.
Joguem pelo Mané, o
eterno Garrincha.
Pai,
ResponderExcluirAcabo de ler seu texto "O dia que lembrei de garrincha".
Me remeteu claramente ao jogo final da Copa de 1994, nos EUA, em que você me levou para vermos a final em plena Avenida Paulista, em telões bem diferentes do que vemos hoje, porém o que me marcou foi a atmosfera, momento de euforia, no exato instante em que Roberto Baggio perde aquele pênalti. A semente vingou ali. Apesar de você pensar que a paixão, o afeto, o engenho e arte foram enterrados com a seleção do Tri, e até acredito nisso, para minha geração do Tetra restou o culto, a celebração, graças aos Pedros, Edmundos e Paulos, agradeço por isso.
Bjos