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No capítulo anterior os Prejudicados bateram à porta. Mas sendo o
preço da liberdade é a eterna vigilância, recorre-se primeiro aos
últimos recursos.
Falcão – (Com bolas de gude) Tá brincando, não troco esta
esverdeada por nada deste mundo. Sente só a firmeza. Uma esfera
perfeita. Repara como desliza... quase não é preciso esforço...
Volupo – Falcão, quantas vezes já te disse que este
esporte não dá futuro pra ninguém. Porque você insiste em ser
diferente, meu filho? Alguém me lembra de assinar um decreto
proibindo, de uma vez por todas, a prática deste jogo. Burocrácio,
como andam as coisas?
Burocrário – Na mesma. Com ligeira tendência de queda.
Volupo – Continue monitorando a bagaça.
Burocrário – Estou indo agorinha mesmo pra Central de
Balelas e Quejandos.
Falcão – (Ao Burocrácio) Epa, paradinho aí: devolve a
gordinha!
Burocrácio – É mesmo uma belezura! (Devolve)
Falcão – Mas não é pro teu bico.
Volupo – Posso falar?
Falcão – Vamos nessa.
Volupo – Negócio seguinte... Ai, cansei: conta pra ele
Baleia.
Baleia – Os Prejudicados mais uma vez botam as manguinhas de
fora.
Volupo – É você na qualidade de ministro nomeado...
Falcão – Permite? Altamente nomeado.
Volupo – Mas que periga ser baixamente nomeado se não
acabar com esta anarquia.
Falcão – Primeira providência: Consultar o Conselho.
Volupo – Como “consultar o conselho”?
Falcão – Ué! Como se consulta o conselho?
Volupo – O conselho é você, idiota!
Falcão – Perdão, mesmo sendo eu o conselho, só imitirei
um parecer após amplas consultas.
Volupo – Agora deu! Quem ele que é: um democrata?
Falcão – Perdão de novo mas, tudo deve ser feito dentro da
mais estrita legalidade. (Abre caderneta) Vejamos... Está bem aqui:
blá, blá, blá... hum, hum, hum... Táqui: Inciso XXXVIII,
parágrafo 27, artigo terceiro, capítulo VI, do Regulamento pro
Seguro Não Morrer de Velho... ponto: Moleza: é botar pra quebrar!
Volupo – Pelo menos parece que sabe ler.
Falcão – Fui! Alguma coisa do comércio, madame?
Devassa – Se não for dar muito trabalho, dá pra passar na
pizzaria e trazer uma gigante de aliche, com bastante azeitona?
Falcão – Sinto, mas não tenho xongas.
Devassa – Debita na conta única.
Falcão – Na um ou na dois?
Volupo – Alguém consegue levar as coisas a sério por
aqui?!
Falcão – Cada coisa a seu tempo. (Saindo) Se não tiver
aliche, posso trazer anchova?
Devassa
– Anchova não gosto, traz de pepperoni com bastante
toucinho.
Volupo – Ainda mando este cara de volta pro orfanato!
Devassa – Podemos ir agora?
Volupo – Agora não vai ser possível.
Devassa – Você tem que conversar com o médico.
Baleia – Minutinho, excelência.
Volupo – Marquei aula de yoga.
Baleia – Segundinho só.
Devassa – Mas...
Volupo – Deixa o Baleia falar, mulher.
Baleia – É que chegou um primo da cunhada de um sobrinho da
empregada da irmã da vizinha da sogra gorda de uma conhecida da
mamãe e...
Volupo – E tá procurando trabalho!
Baleia – Não chega a tanto.
Volupo – Devassa, minha flor, ainda temos vagas no
Ministério das Forças Ocultas?
Devassa – Qual o nível de instrução dele?
Baleia – Phd em mercandaizing.
Devassa – Hum... talvez pra entubar bracholas no período
vespertino.
Baleia – Ele é perito em projetos culturais, acrescento.
Volupo – Manda passar no almoxarifado e pegar uma arara
fixa. Mas vou logo avisando, oitenta e cinco por cento do salário
vem direto pro bolso do besta aqui.
Baleia – Anotado.
Volupo – Se perguntarem por mim diga que estou em reunião
no clube .
Devassa – Nananinanão. O senhor vai visitar a Emengarda.
Faz mais de mês que o senhor não comparece.
Volupo – Saco! Já devíamos ter jogado uma pá de cal nesta
história.
Devassa – E acabar com o nosso bem bom?!
Volupo – Aquilo é um entulho.
Devassa – Mas é nossa sobrinha e se regemos, regemos em seu
nome, lembre-se disto.
Volupo – Mas aquilo é uma inês morta.
Devassa – Fala baixo que ela pode ouvir. Vamos, entre. E
bote um sorriso nesta cara de gamela. Cadê a minha fofinha?
Emengarda – Ahhhh...!
Devassa – Titio e titia tão ati!
Emengarda – Ahhhhhhhhhh....!
Devassa – Tê ti foi? Tá dodói ati?
Emengarda – Ahhhhhgggg....!
Volupo – Pára!
Devassa – Deixa de ser grosso.
Volupo – Se já não gostava de repolho, agora então...!
Devassa – Tínhamos que ter evitado aquele acidente.
Volupo – A culpa foi sua. Você inventou aquela reforma
estrutural no palácio.
Devassa – A culpa foi nossa. Você concordou inteiramente
com o projeto.
Volupo – O que a gente não faz para impressionar a massa!
Devassa – Parece que foi ontem. Sempre fui uma idealista,
sabia? Sonhava com um mundo melhor, onde cada um pudesse ir à Paris
pelo menos uma vez por ano. Mas o destino é cruel, tá nem aí pras
boas intenções. E hoje, o que sou? Uma cética, cuja únicas
venturas são alguns míseros trocados que mal dão pra despesas do
dia a dia em Miami. Ah, quem me dera voltar ao passado...
Continua...
Continuo no encalço desta trama. Quero ver onde essas espertezas vão dar!
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